segunda-feira, 29 de junho de 2009

10- obstinação

Tenho tido encontro com escritores que chegam a mim sem que eu faça o menor esforço. Isto me anima e não paro de ler e escrever. Eles estão comigo eu sei, me fazendo revelações. Pareço louca ao dizer isso? Delirante? Obcecada? O próprio ato de escrever é algo maluco, escrevemos para que? Se no momento em que escrevemos nós somos os únicos leitores, os únicos críticos. Crônicas domésticas a serem jogadas no lixo. Por que escrevemos?

Fui ontem conhecer a maior livraria do país, eram tantas prateleiras e livros que não sabia nem por onde começar. Quantos autores! Infinitas palavras! Pensei. Parei em frente a uma estante qualquer e passei os olhos nos títulos e autores. Muitos que eu não conhecia e nem fazia idéia. Estava alheia, apenas olhando, perdida em meio a tantos livros, temas, títulos, imortais e mortais. Deixei apenas meus olhos transcorrerem curiosos. Até que um autor me chamou, “Ernesto Sabato”. Sempre tive curiosidade para lê-lo, mas nunca fui atrás. Era um livro pequeno, de poucas páginas e não era muito caro. Confesso que nem me ative ao título, somente ao autor. Abri, dei uma lida rápida e me identifiquei no ato.

Descubro o quanto eu gosto de escritores latinos, pensando bem, escritores da língua espanhola; cubanos, chilenos, espanhóis, até mesmo mais, falo em quantidade, do que os meus conterrâneos. Por que? Acho que minha identificação é mais metafísica do que regional e política. Sinto minha alma estrangeira, exilada, colonizada, como a deles. Ela se identifica com mundos eqüidiferentes.
Cheguei em casa, abri o livro “O escritor e seus fantasmas” e me deparo com respostas para as perguntas que tenho feito ao longo destas páginas. Sei que não sou um escritor, nem descobri ainda se um dia serei. Escrevo apenas para descobrir em mim mesma e na minha vida algum sentido. Tenho hoje, apenas interesse pela existência e procuro na literatura obter respostas pra as minhas angústias. Penso que a angustia mata quando a alma se esgota. Minha alma está cheia de vida enquanto anseia por conhecer. E isto está fazendo sentido para mim. Como me disse Rilke: o exame de consciência que lhe peço, não terá sido inútil. Sua vida, a partir desse momento, há de encontrar caminhos próprios”.
Para Ernesto Sabato: “A literatura não é um passatempo nem uma evasão, mas uma maneira – talvez a mais completa e profunda – de examinar a condição humana”. Para ele “parece difícil escrever algo profundo que não esteja ligado de maneira aberta ou emaranhada à infância”.

- A distancia da minha casa até a casa da minha avó tinha uns dois quilômetros. Minha cidade era cheia de relevos e nesse trajeto, subia ladeira, chegava-se na praça que era plana, descia ladeira, subia novamente e descia até chegar a casa com porão. Eu me lembro que, em uma das minhas idas até lá, caminhando sozinha, absorta com os meus pensamentos, tive uma sensação que nunca mais esqueci. Senti uma vontade enorme de não chegar nunca, era bom caminhar e pensar, queria continuar assim, pensando e caminhando infinitamente.
- E em que pensava e que era tão bom?
- Daria tudo para lembrar. Tinha mania de inventar histórias. Acho que toda criança tem uma fase na vida que inventa histórias. E acho que naquele momento devia estar fantasiando uma estória muito interessante.
- É verdade, me lembro que inventava estórias e eu era sempre o protagonista e estava sempre fugindo de casa. Acho que tem um momento na infância que ansiamos por liberdade. A inocente liberdade.
- Acho que estou vivendo isso novamente, sinto-me como estivesse caminhando e não paro de pensar e escrever, e a sensação no momento é que não quero que pare.
- E quando parar...
- Estarei Livre.

Para Borges o Livro é o mais espetacular instrumento utilizado pelo homem, é uma extensão da memória e da imaginação. Para ele um livro pode conter muitos erros, mas, ele conserva algo sagrado, o desejo de encontrar felicidade, de encontrar sabedoria.
Portanto, agora, não temo os meus erros, foi difícil começar, sinto que não quero parar. Mas, me vem agora um novo desafio, quando parar. Quando se dá por terminado um livro? Um livro leva a outro que leva a outro e assim por diante? O livro sou eu, mesmo que o autor seja outro, mas quando leio e encontro essa felicidade, me encontro no livro. As palavras são infinitas, vários pontinhos formando este espaço que é o livro, infinitos livros formando este tempo que é a memória. Vou morrer, eu sei, mas antes vou deixar minha história em cada livro que eu ler, e se possível em cada livro que eu escrever. Desejo que a minha memória seja a sua, que seja a de quem lê. Que seja eterna.

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